quinta-feira, 2 de junho de 2011

Você Cuida da Espiritualidade de seu Filho? - Parte 3

Como essa palavra “acontece” na sua casa? Para praticar é preciso pertencer a alguma religião? A Revista Crescer decidiu discutir o termo e o tema com pessoas bem diferentes e o resultado é surpreendente: praticar espiritualidade pode ser mais simples do que você imagina.

Irei publicar semanalmente, a materia que foi dividida em cinco partes.

De repente, aprende

Acompanhar uma criança crescer é voltar a nos surpreender com os detalhes. Desde bebê, tudo é novidade, mistério, um pedaço do sagrado. Tudo é encanto. E recuperamos a razão do contemplar. Ter filho dá essa “coisa” na gente: temos vontade de juntar o que é mais bonito e mostrar, um por um. E torcer para que ele não perca nada. Isso também é praticar espiritualidade. Você quer compartilhar. “É quando você vê uma flor linda e quer contar para seu marido, quer que ele veja a mesma beleza que você viu”, diz o padre Claudio. Voltar-se para observar a vida que pulsa no outro nos joga a outro exemplo de espiritualidade: a compaixão. No sentido etimológico, significa “sofrer com”. Se o outro importa para mim, eu sofro quando ele sofre.

Aconteceu numa escola no Canadá. Sylvie, 9 anos, foi para a escola usando tênis com velcro. Algumas outras crianças zombaram dela, dizendo que estava usando tênis de bebê. Esse é o tipo de humilhação que arrasaria o espírito de qualquer criança de 9 anos. Mas então algo aconteceu. Quando a sala estava saindo para o intervalo, a melhor amiga de Sylvie, June, trocou um pé do tênis com ela. Sem dizer uma palavra ela transformou um ataque maldoso e excludente em uma brincadeira. A menina passou o recado: “Ela é minha amiga – se zombarem dela, vão estar zombando de mim”.

Essa história está no capítulo escrito pela canadense Mary Gordon, perita em educação familiar, no livro Honrar a Criança – Como Transformar esse Mundo, coletânea de textos sobre a infância, lançado no Brasil no mês passado, pelo Instituto Alana. A autora fala do poder da empatia, que tem tudo a ver com espiritualidade: a menina “entrou no sentimento” da amiga e melhorou a situação. Nada mais transformador – e espiritual. “A empatia é o verdadeiro cerne da sociedade civil, seja essa sociedade a sala de aula, a escola, a comunidade, o país ou a nossa ‘aldeia global’”, escreveu a especialista.

Por quê?

Praticar espiritualidade requer dedicação. É preciso paciência naquele dia que o trânsito fez você se atrasar para pegar seu filho na escola e ainda quase perder a consulta dele no pediatra, enquanto ele insiste em observar as formigas caminhando na calçada. Ele está puxando você para a espiritualidade, mas as coisas que nos “desgraçam”, ou seja, “que nos tiram a graça” – ainda usando as definições do professor Cortella –, estão aí a todo momento. É hora de buscar alternativas. Não podemos aceitar que a vida se resuma a conseguir sobreviver a um dia de cão. Temos que querer mais para nós mesmos e nossa família. E isso não necessariamente é conseguir fazer a tão sonhada viagem em família para Fernando de Noronha. Pode estar naquela gargalhada depois de um banho de chuva inesperado, no sorriso do bebê depois de seu aperto gostoso na barriga dele ou naquela história que ele vai contar quando chegar da escola. A criança precisa enxergar a vida com significado e aprender que o que ela faz influencia o outro, seja a família, os amigos, o cachorro, a violeta na sala que ela já aprendeu a não mais arrancar as florzinhas. Nossas atitudes têm consequências e está em nossas mãos dar um rumo a elas. É o mesmo caminho da felicidade, não?

Pois foi por aí que um estudo do ano passado relacionou espiritualidade com felicidade. Segundo o pesquisador mark holder, da universidade de british columbia, no canadá, um estudo coordenado por ele mostrou que as crianças que dão significado para suas vidas desenvolvem relacionamentos profundos e de qualidade – ambos medidas de espiritualidade –, além de serem mais felizes. A razão está aí. Viver tem de fazer sentido. Muito sentido.

Praticar espiritualidade é...


”Penso sempre em atividades como música, pintura, escultura com massinha, por exemplo, que manterão as crianças sensíveis.”

Paulo Porto Correia, diretor do Instituto Triângulo e pai de Pedro, de 6 anos, e Carol, de 11 meses

2 perguntas para Mario Sergio Cortella

Como expressar a espiritualidade?
Quando você conecta-se a outras pulsações de vida. Quando eu me relaciono com outras pessoas e essa relação é respeitosa, cuidadosa, prazerosa, eu estou fazendo a vida vibrar em outro. Eu tenho um hábito. Quando gosto demais de um livro, esteja onde estiver, eu o fecho e bato palmas. Parece loucura, mas é a minha maneira de render graças. Render graças: o que deixa a vida mais engraçada. Quando você rende graças a um alimento gostoso, a uma música boa, a uma convivência, a um local bonito, você se sente parte daquilo.

O que os pais podem ensinar?
Educar para espiritualidade na família significa ser capaz de render graças o tempo todo, inclusive na refeição. Impedir o desperdício, por exemplo. Meus pais não admitiam que ficasse comida no prato. Pode parecer algo mesquinho, mas não era uma questão econômica, e sim para render graças ao alimento. E hoje você vê famílias que vão a um fast-food com os filhos e aceitam que eles façam guerra de batata frita. Por isso educar para a espiritualidade na família é primeiro ser capaz de construir momentos de convivência em que a gratidão venha à tona.

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